Dança do Créu
Composição: Mc Créu
A primeira é devagarzinho
Só o aprendizado.
É assim, oh!
Créeeeu…(3x)
Se ligou? De novo!
Crééééu…(3x)
…
Tá aumentando mané!
Créu, créu, créu, créu
Créu, créu, créu, créu
Créu, créu, créu, créu
Créu, créu, créu
Créu, créu, créu, créu
Créu, créu, créu
Segura DJ!
…
Jamais me esquecerei o dia em fomos, eu e mais duas três mulheres, abundantemente humilhadas por aquela mega bunda, afinal vivemos no país onde tudo termina em bunda. O Brasil é um nascedouro de bundas. Neste bundocosmo muitas mulheres não sonham com um lugar ao sol, mas com ter uma bunda exposta ao sol. São as neobundas! Algumas bundas surfistinhas conseguem a proeza de se transformarem em escritoras. É o país das bundalhas onde não se coloca os pés na calçada da fama, mas a bunda na fama! A xuxização precedeu a bundismo e o resultado foi o homo bundus que reinvindica o bundopólio para si.
Era uma terça feira abafada pelo verão da Ilha da Magia e da Carestia, a cidade conhecida no Brasil como a cidade de Floriano, Florianópolis, e por nós, a Ilha de Santa Catarina. Era março e agora estávamos nós os moradores da Ilha, livres de todo tipo de turistas, que no verão, infernizavam a vida de quem vive aqui. Acabara de sair do consultório da minha dermatologista, Dra. Cássia Schlickmann Mendes, que ficava no sétimo andar do Shopping Trindade, próximo à Universidade. Fora ali buscar a minha receita de um creme milagroso, conhecido cientificamente como Dimetilaminoetanol, nos consultórios dermatológicos como DMAE, ou mais vulgarmente como efeito cinderela. Este creme é muito procurado pelas mulheres após os trinta anos, porque logo após a sua aplicação a pele apresenta um efeito firmador e tensor. É um lifting rápido. In Natura é encontrado em peixes como salmão, anchova e sardinha. Ah! e em algumas bundas…
O problema deste miraculoso produto, a fonte da juventude das mulheres de minha idade é o preço. Como é caro, as dermatologistas receitam pequenas porções de 15, no máximo 20 gramas, para ser aplicado economicamente ao redor das linhas de expressão, dos chamados pés-de-galinha, em redor dos olhos. Deixei minha receita numa farmácia do Shopping: Alana May. O farmacêutico gentil e bonito, sem necessitar de efeito cinderela nenhum, atendeu-me com a gentileza de sempre, informando-me que a receita ficaria pronta no outro dia. Ele era belo no conjunto: altura, sorriso, olhos azuis, uns 35 anos, cabelos castanhos caindo displicentemente pelos ombros, um perfume de cedro e braços selvagens. Sempre gostei de homens de braços peludos. Aliás, gostava… Efeito príncipe que sempre vira sapo…
Na quarta feira voltei à farmácia para pegar meu efeito cinderela. O calor do início de março era insuportável. Às dez horas da manhã o termômetro já marcava 30 graus. Por conta do calor e, como as aulas ainda não haviam iniciado, todos nós andávamos de bermuda e sandálias, mesmo na área próxima da UFSC. Existiam, as deusas, que dispensavam o recato e errabudeavam de mini-shorts, quase expondo suas partes pudendas na cara dos homens, como sempre, aficionados pelas bundas que saltavam exprimidas de dentro daqueles mínimos pedaços de pano. Algumas deusas saiam da praia e com vestidos transparentes entravam pelas lojas do Shopping esfregando suas curvas nos olhos de todos.
Cheguei à Alana May para pegar meu produto e sentei-me juntamente com outras duas mulheres no banco de madeira da farmácia, esperando nossa vez. Não precisávamos dizer o nome, porque tanto o farmacêutico como as atendentes já nos conheciam. Bastava esperar que elas localizassem o pacotinho com o produto. Enquanto isto, seis pares de olhos disfarçavam e investigavam aqueles braços de Tony Ramos. Com nosso olhar imerso naquela selva castanha, percebemos abruptamente que nosso campo de prazer fora encoberto por algo enorme.
Tapou completamente nossa visão uma gigantesca bola de carne bronzeada e arredondada. O que era aquilo?! Uma delineadíssima bundaça, tendo como detalhe um pequeno biquíni que tentava se equilibrar naquela macrobunda. O biquíni branco apenas enfeitava, era um mísero detalhe naquela montanha obscena. Cobrindo aquela bundiota apenas um vestidinho transparente de voal.
Era uma arquibunda que abundava suculentamente a dois palmos de nossas caras pasmadas! Seis olhos não davam conta de abarcar aquele monumento de curvas. E o pior, para inveja suprema e fatal daqueles seis olhos carcomidos de inveja: não tinha uma mísera celulite. Aquele ostensivo rabo empinava-se ostensivamente em nossa cara. Odiamos tanto aquela mulher que não queríamos olhar seu rosto. Sua bunda melancia nos bastava para tanta humilhação. Mas ela queria liquidar conosco de uma vez só. Para ela não bastava ter aquela bunda descomunal, tinha cabelos loiros, olhos claros, rosto triangular. Mesmo sem querer ver o resto daquele corpo, a Mulher Bunda nos obrigou a isto. Pediu sua encomenda e, enquanto esperava, tentou-se acomodar aquele traseiro no banco ao nosso lado, nos presenteando com uma bundada.
Quanta humilhação! Foi uma bundança geral. Naquele banco caberia pelo menos, mais duas mulheres, cujos traseiros tivessem proporções humanas. Mas, para que coubesse a fuselagem daquela potranca, nós três tivemos que recuar e espremer nossos tristes e, agora, amassados traseiros. Ficamos com nossa egobunda no chão!
Ficamos ali por alguns minutos que pareceram eternidade. Não falávamos, olhávamos para qualquer lugar, que não fosse para ela. Para nossa surpresa, já esperávamos há uns cinco minutos, a encomenda dela foi achada por primeiro. O bunda-mole peludo, quase babou ao pronunciar o nome da dona da bunda, que agora nem me lembro mais, e uma mulher como aquela não devia ter nome, afinal sua bunda era muito mais que um RG. Perdi até a frase. Voltando ao embasbacado. O animal, no ápice do cio, chamou a mulher. E só agora, diante de seis olhos extasiados e três bundas humilhadas, entendemos porque a encomenda dela fora achada. Não era uma minúscula bisnaga de 15 ou 20 gramas. Era um pote de DMAE de um quilo!
Não entendi nada. Observei as mãos, da Mulher Bunda, retirar de uma bolsa. Tenho que parar para falar da bolsa. Para nosso espanto, a bolsa era Louis Vuitton preta, cheia de argolas e laços. Não combinava com a roupa de praia dela, mas era uma legítima LV que deveria custar uns 2.500,00 reais, no mínimo. A lacraia retirou um cheque ouro do Banco do Brasil que já estava assinado. Enquanto eu segurava nas mãos o valor de 35,00 reais que pagariam minha bisnaginha de 15 gramas, ela preencheu um cheque de 3.000,00 por um quilo de DMAE.
O bundalopithecus observava a mulher preenchendo o cheque, babando. Odiei aquele homem. Eu e as outras mulheres nos entreolhávamos enquanto a outra balconista nos chamava para entregar nossas encomendas. A tanajura preencheu rapidamente o cheque, entregou o mesmo, pegou seu pote e saiu satisfeita, rebolando ostensivamente seu rabo avantajado. Que falta de vergonha na bunda! Pública e impudicamente aquele traseiro bundeante suplicava um créu! As outras mulheres me olhavam sem saber o que pensar ou dizer. Pensei: provavelmente deve ter um salão de beleza. Mas algo estava errado. Salão de beleza não aplicava DMAE naquela quantidade. Não agüentei e perguntei àquele beija-bunda na nossa frente:
– Ela é dona de salão de beleza?
– Não, respondeu sorridente o animal no cio…
Já tinha passado por ridícula. Iria até o fim. As outras duas mulheres já com os pacotinhos na mão, também queriam sabem o enigma da tanajura e aguardavam:
– Mas pra comprar um quilo de DMAE…
– Bem ela usa nela…
– Mas tanto DMAE assim pra ser usado no rosto estraga.
– Ela não usa no rosto?
– Não?
Com os olhos brilhando como de besta próximo ao gozo, e, curtindo com nossa cara, respondeu, apreciando cada gesto de nossa parte:
– Ela usa DMAE na… bunda!
Silêncio de três desbundadas reduzidas à sua mera insignificância. Não satisfeito com nosso silêncio constrangedor, o tarado ainda acrescentou:
– E o marido, podre de rico, paga tudo contende da vida… É um investimento… Também aquilo é um monumento…
Sai dali odiando aquele bundolátra indecente, odiando aquela vaca rabuda, aquela pornô bunda que tinha nascido com o caráter virado para a lua, que gastava 2.500,00 numa bolsa francesa, praguejando contra aquele marido que gastava 3.000,00 num pote de DMAE, para manter aquela bunda empinada, sem nem um mísero buraquinho de celulite. Não invejava a bolsa, nem do marido rico, mas aquele bunda… Afinal, não se pode ter tudo na vida! Aquela bunda estragara meu dia, meu verão, meu mês. Mas eu dava minha bunda pra bater que aquela bunda não permaneceria nas mãos de um único dono por muito tempo. Era bunda demais para um único degustador… Era como uma melancia, demais para um só…
Cada vez que, economicamente, passava o DMAE nos cantos dos olhos, eu imaginava uma cena pornográfica: aquela bunda deitada num lençol e o marido rico, babando, com as mãos enlambuzadas de creme, massageando aquela tanajura dourada.
No Brasil das bundalhas, ter bunda grande é ter selo de qualidade HOMETRO (Homem que mede o caráter de uma mulher pela centrimetragem de suas nádegas). Vivemos numa sociedade bundocrática: manda e faz sucesso quem tem a maior bunda. Aqui bunda não é mais substantivo e sim verbo: eu bundo, tu bundas, ele bunda, nós bundamos, vóis bundais, eles bundam. Aqui, bundam todos. Vivemos no reino da Bunda Sutra. Também foi o tempo em que se pedia humilde mão em casamento. Hoje pede-se a majestosa bunda em casamento. Vivemos na Era Bundozóica nos quais os Hometros buscam a abundessência.
Ódio às bundas burguesas! Ódio às bundas pocotós! Ódios às chinocas! Ódio à todas as bundas da Playboy! Ódio às bundas da Praia Mole! Ódio às bundas melancias! Ódio às tanajuras! Ódio à bundarização do Brasil, na qual a mulher só vale pela bunda que carrega. Estava sofrendo de bundopatia crônica.
Três meses depois, em julho de 2008, lá estava eu na mesma farmácia, com nova receita. Notei que o beija-bunda peludo não estava lá. Estranhei porque ele era o farmacêutico chefe. Perguntei por ele e a atendente que era minha conhecida me apresentou a nova farmacêutica. A atendente foi buscar minha bisnaginha de creme. Enquanto conferia o dinheiro, perguntei-lhe:
– Que aconteceu com ele. Mudou de farmácia?
Como a farmácia estava vazia naquela manhã, a atendente, me puxou pelo braço para um canto retirado do balcão e voz baixa me informou com aquele sotaque manézinho.
– Nem te conto, nega… Fugiu para a Europa.?
– Fugiu? Como assim?
– Fugiu… com a loira do Pote de DMAE?
Silêncio.
– Fugiu com ela, quer dizer, com a bunda dela…
Aquele outro bundão havia levado um pé-na-bunda. Triste é o país que valoriza a bunda em detrimento da inteligência. No Brasil a bunda abunda e falta cérebro, sobra a inteligência glútea. Aqui é o Império das Bundas, e os ícones são as rainhas Rita Kadilac que se autonomeou como vovó das mulheres frutas2, Gretchen, Carla Perez. Estas musas do bumbum ainda tinham nome. Mas agora o nome desapareceu, as funk bundas são identificadas por apelidos que nomeiam o formato do seu derrière: Mulher Moranguinho, Mulher Melão, Mulher Maçã, com seus 115 cm de pouca suculenta, Mulher Melancia com seus medidos 121 cm de pura inteligência e que foi lançada pelo MC Créu, a Mulher Jaca, prima da Mulher Melancia (uma verdadeira família bundalógica), a Mulher Filé descoberta por MC Catra, que consegue a proeza de fazer uma parte alojada no meio do seu filé de 100 cm piscar na chamada dança do Pisca- Bumbum etc. Enfim, o Brasil criou uma espécie única no mundo: as mulheres hortifrutigranjeiras, completamente analfabundas cujo universo musical é astronômico: vai do Créu ao Rebolation, que são doentes pela otoriedade. Elas são as hiperfêmeas, as bundabotero. Estas mulheres frutas com sua inteligência ginobundal de 1 bundabyte, zeroglotas, só poderão gerar filhos da fruta!
Em 1990, o grande Tim Maia lembrou-se de um adágio popular muito conhecido: “O Brasil é o único país onde prostituta tem orgasmo, cafetão tem ciúme, traficante é viciado”, complementando que aqui “pobre é de direita” . Poderíamos complementar de outra forma: O Brasil é o único país onde prostituta tem orgasmo, cafetão tem ciúmes, traficante é viciado e bunda tem caráter. Na semana em que terminava este conto fui surpreendida com uma notícia: a brasileira Melanie Fronckowiak, foi eleita Miss Bumbum Internacional 2008 e recebeu um prêmio de 43 mil reais pela sua bunda. E eu que já achava ridículo Miss Universo… Lógico, a Miss Bumbum Internacional tinha que ser do país das bundalhas. Vivemos numa bundosfera na qual a burritsia suplantou a intelligentsia. Se os Estados Unidos reiventaram o termo bulesco e em 1920 criaram a comédia burlesca para designar shows de striptease, a nós só restou a criação da comédia bundesca, o striptease cru e nu da bunda na clitomídia.
Sai dali contente da vida, feliz com minha humilde anatomia, imaginando o efeito melancia estampada na cara daquele empresário rico e corno. Cada homem tem a bunda que merece e nada como uma bunda atrás da outra…
A seguir minha ginocrítica: Viva o cérebro! Abaixo as mulheres melancias! Fim do Bunda Sutra. Mil vaias para Era Bundozóica! Bem vinda a geração do Pós-Bunda!!
Aqui só a bunda foi abundantemente tudo…
MANISFESTO PÓS BUNDA
Frida Kahlo, Viva la vida
Vivemos na Era Bundozóica nos quais os Hometros buscam a abundessência.
Ódio às bundas burguesas! Ódio às bundas pocotós! Ódios às chinocas! Ódio à todas as bundas da Playboy! Ódio às bundas da Praia Mole! Ódio às bundas melancias! Ódio às tanajuras! Ódio à bundarização do Brasil, na qual a mulher só vale pela bunda que carrega. Estava sofrendo de bundopatia crônica.
Mas agora o nome desapareceu, as funk bundas são identificadas por apelidos que nomeiam o formato do seu derrière: Mulher Moranguinho, Mulher Melão, Mulher Maçã, com seus 115 cm de pouca suculenta, Mulher Melancia com seus medidos 121 cm de pura inteligência e que foi lançada pelo MC Créu, a Mulher Jaca, prima da Mulher Melancia (uma verdadeira família bundalógica), a Mulher Filé descoberta por MC Catra, que consegue a proeza de fazer uma parte alojada no meio do seu filé de 100 cm piscar na chamada dança do Pisca- Bumbumetc. Enfim, o Brasil criou uma espécie única no mundo: as mulheres hortifrutigranjeiras. Elas são as hiperfêmeas, as bundabotero. Estas mulheres frutas com sua inteligência ginobundal só poderão gerar filhos da fruta!
Viva o cérebro! Abaixo as mulheres melancias! Fim do Bunda Sutra. Mil vaias para Era Bundozóica! Bem vinda a geração do Pós-Bunda!!
Vaias a la Bunda Louca
1 Menção Honrosa Nacional no Concurso Nacional Cidade de Araçatuba 2009, São Paulo.
2 Declaração feita em Abril de 2010.