Publicado em 1883, o ensaio A poesia científica de Martins Júnior funda-se claramente no clima positivista que dominava a maior parte da intelectualidade brasileira naquele período, a partir do último quartel do século XIX. Formado em direito, como muitos de sua geração, José Isidoro Martins Júnior estudou na Faculdade de Direito do Recife, onde sofreu a influência de Tobias Barreto, maître à penser de muitos intelectuais daqueles tempos. Viveu 44 anos, tendo nascido no Recife, em 24 de novembro de 1860, e falecido no Rio de Janeiro, em 22 de agosto de 1904. Foi membro da Academia Brasileira de Letras e, em sua sessão de posse, Sílvio Romero foi indicado para fazer o discurso de acolhida. Era o encontro de inteligências muito similares, já que ambos mostravam claramente a influência do Positivismo, assim como a de Tobias Barreto.
Ora, não apenas nesse ensaio, se pode ver a formação positivista ao lado da poesia. Em seus tempos de acadêmico de direito, Martins Júnior dedicou-se tanto a estas quanto àquele. Algumas de suas produções trazem a colaboração com Clóvis Beviláqua, que viria a ser notável jurista. De fato, a imensa maioria dos poetas que surgiram naqueles anos aliavam o estudo de Augusto Comte ao flerte com as musas. Hoje pouco conhecemos desses poetas e dessa poesia, e isso não é difícil de entender. A instrumentalização da arte sempre subordina esta a uma linguagem que lhe é externa e, portanto estranha. O protagonismo passa a ser desempenhado por esse elemento externo e, com isso, a arte agoniza. Se inspecionamos os poetas surgidos nesse último quarto do século XIX, os que ficaram, que ainda despertam algum interesse, são justamente os que lograram se desvencilhar do Positivismo e, bem ou mal, insistiram na especificidade e na proeminência da arte literária. Não quer dizer que tenham feito excelente obra poética; significa apenas que fizeram obra literária.
De outro lado, é importante esclarecer o que Martins Júnior (assim como seus contemporâneos) entenderam o termo ciência. Para isso, o prefácio de seu livro de poemas Visões de hoje pode ser bem ilustrativo. Aí ele diz que a poesia “deve ir procurar as suas fontes de inspiração na Ciência; isto é, na generalização filosófica estabelecida por Auguste Comte sobre aqueles seus troncos principais de todo o conhecimento humano”. Fica evidente, assim, que ciência, para Martins Júnior, confunde-se com filosofia e esta se resume ao Positivismo. Para o leitor de hoje, quando se fala em poesia científica, de imediato vem à mente o nome de Augusto dos Anjos. O poeta paraibano está mais próximo, bem mais próximo, do que entendemos contemporaneamente por poesia e por ciência, muito embora tenha se inspirado em elementos filosóficos próprios do XIX e, mais especificamente, próximos do Positivismo.
Dessa maneira, o ensaio que aqui apresentamos busca entender a poesia como decorrência de uma atitude filosófica. Em consequência, seus meios expressivos, suas imagens, sua lógica expressiva, tudo se subordina ao pensamento de Comte e aí deve buscar inspiração. De outro lado, isso significa que a criação poética é um capítulo dentro da luta pela evolução da sociedade e dos indivíduos, o que vale dizer que estamos aqui diante de elementos iluminista que ainda vigoravam à época, elementos de que o Positivismo é herdeiro direto, embora equivocado.
Finalizando, pode-se dizer que, se a leitura de A poesia científica não ajuda a entender a poesia dos melhores escritores daquele período, certamente ajuda a compreender o pano-de-fundo sobre o qual e, muitas vezes, contra o qual eles criaram suas obras poética. É outro modo, também importante, de ler e entender melhor a literatura brasileira de finais do século XIX e inícios do XX.