Conversas de Rodapé: um estudo da atividade mediativa e formativa em Reinações de Narizinho, da Editora Companhia das Letrinhas

Raffael Lucas Fernandes Costa

RESUMO: Monteiro Lobato entrou para o rol de domínio público no ano de 2019, o que pode ser visto com certo brilho para os olhos dos editores, por terem agora mais liberdade em lidar com a obra. Na edição de 2019, pela Companhia das Letrinhas, de Reinações de Narizinho, tem-se um recurso inovador: conversas de rodapé ao invés das tradicionais notas de rodapé. Nesta investigação, nossa hipótese se baseia nesses diálogos de rodapé enquanto técnica de mediação. Durante o percurso de averiguação de nossa hipótese, pudemos notar recursos estilísticos inovadores no paratexto “nota de rodapé”: aos olhos do leitor parece ser uma história paralela à principal. Além disso, notamos um outro processo que caminha em concomitância com a mediação: a formação do leitor literário. O nível de criticidade das conversações é apresentado de um modo que quem lê, não sai mais o mesmo, uma vez que o contato do texto apresenta marcas de formação. As reflexões nesses diálogos paralelos ao texto são como mediações entre épocas, pois as personagens discutem expressões idiomáticas não mais utilizadas e problemáticas sociais em categorização generalizada. Para esse estudo, nos serviremos dos teóricos Genette (2009), Peregrino (2011), Pina (2011), Romano (2017), dentre outros.

PALAVRAS-CHAVE: Monteiro Lobato; Notas de rodapé; Mediação de leitura; Formação do leitor. 

ABSTRACT: Monteiro Lobato joined to the public domain roll in 2019, which can be seen with a certain sparkle in the eyes of the editors, as they now have more freedom to deal with the work. In the 2019 edition, by Companhia das Letrinhas, from Reinações de Narizinho, there is an innovative feature: footer conversation instead of traditional footnotes. In this investigation, our hypothesis is based on these footer dialogues as a mediation technique. During the course of investigating our hypothesis, we noticed innovative stylistic features in the paratext “footnote”: in the eyes of the reader it seems to be a parallel story to the main one. In addition, we note another process that goes side by side with mediation: the formation of the literary reader. The level of criticality of the conversations is presented in a way that those who read it don’t leaves the same, once the text has formation marks. The reflections in these dialogues parallel to the text are like mediations between eras, since the characters discuss idioms that are no longer used and social problems in generalized categorization. For this study, we will use the theorists Genette (2009), Peregrino (2011), Pina (2011), Romano (2017) among others.

KEYWORDS: Monteiro Lobato; Footnotes; Reading mediation; Reader training.

Introdução 

Não é preciso fazer muitas pesquisas para reconhecer que Monteiro Lobato, após quase cem anos de produção de sua obra infantil, continua a fazer certo sucesso editorial. Além disso, fugindo do padrão dos escritores, de uma significativa parcela que só faz sucesso quando falece, Lobato, quando vivo, viu seus textos infantis, sobretudo, serem reeditados, conforme comenta em várias cartas ao amigo Godofredo Rangel, e publicadas em A Barca de Gleyre, informando sobre seu sucesso de vendas para o jovem público leitor.

O universo do Sítio do Pica-pau Amarelo é construído de maneira que imaginação e realidade se fundem, sem que haja elementos marcantes dessa transição. Essa entrada que o leitor jovem experimenta no mundo do maravilhoso, sem prévio aviso, parece ter sido uma estratégia que ganhou o gosto dos pequenos leitores no início do século XX.

 Lobato tinha um contato bastante direto com o seu público leitor, haja vista a quantidade de correspondência infantil que recebeu de seus pequenos admiradores ao longo de toda sua produção infantil, dentre os anos de 1921 a 1946, aproximadamente². Não só foi escritor, nesse período, como também editor e, por isso, via o livro enquanto produto mercadológico, que devia ser atraente não somente na elaboração textual, mas também nas imagens e ilustrações, bem como no material utilizado para confeccioná-los. Vejamos:

Monteiro Lobato preocupa-se – e muito – com a materialidade dos livros de sua editora. Investe na qualidade gráfica dos volumes, moderniza as capas, encomenda desenhos especiais para ilustração e faz o possível para que o lançamento de seus editados seja acompanhado de resenhas e de críticas na imprensa. Paralelamente a estas providências que toma enquanto editor, em suas discussões sobre livros começa a tomar corpo uma linguagem comercial entretecida de metáforas econômicas que não o abandonarão jamais. Vão segui-lo pelo resto da vida, não obstante a leve dor na consciência que de vez em quando provocam. (LAJOLO, 2000, p. 32) 

É inegável que a literatura infantil e juvenil brasileira tem em Lobato um marco histórico no Brasil. Parece haver com ele uma construção de identidade nacional, de uma literatura infantil que trata de aspectos nacionais, mas sem deixar de dialogar com grandes clássicos da literatura universal. Temos nas aventuras da turma do Sítio do Pica-pau Amarelo uma significativa presença de intertextualidade, que agrega aos leitores o poder de dialogar com outras personagens, como as dos contos de fadas ou mesmo as dos quadrinhos, ou ainda com textos de clássicos da literatura universal, como Dom Quixote, Peter Pan e Hans Staden. Vejamos o que Lajolo e Zilberman (2017, p. 80) dizem sobre essa questão em Literatura Infantil Brasileira, uma nova outra história:

Na literatura infantil brasileira, é Monteiro Lobato o primeiro autor a se valer com competência da prática intertextual: em Reinações de Narizinho, ele desconstrói contos de fadas convencionais, ao alojar no Sítio do Picapau Amarelo as princesas que abandonam o mundo da fantasia em que viviam, e ao expulsar dona Carocha, quando esta busca repatriar as fugitivas. E mais: desde Reinações de Narizinho (1931) até O Picapau Amarelo (1939), passando por Memórias de Emília (1936), Lobato incorpora a suas obras elementos da linguagem cinematográfica (o caubói Tom Mix e o marinheiro Popeye) e reelabora clássicos e modernos da literatura ocidental, como Dom Quixote (1605-1615) e Peter Pan, peça encenada em 1904, a que se seguiu a versão narrativa de 1906 (LAJOLO; ZILBERMAN, 2017, p. 80).

Com seu singular estilo linguístico, pôde bater recordes de tiragem e não só se destacou em território nacional, como também na Argentina e em diversos outros países onde suas obras infantis foram traduzidas. Em A Barca de Gleyre, conjunto da correspondências de mais de quarenta anos com o amigo Godofredo Rangel, Lobato diria a ele, em carta de 11 de janeiro de 1925: “Traduzirás uns três [livros], à escolha, e mos mandarás com o original; quero aproveitar as gravuras. Estilo água de pote, hein?” (LOBATO, 1956, p. 275). Esse estilo chamado de “água de pote” parece que ele imprimiu, em especial, na forma de Dona Benta narrar e mediar histórias para as crianças do Sítio. Em Reinações de Narizinho, temos:

– Leia da sua moda, vovó! – pediu Pedrinho.
A moda de Dona Benta ler era boa. Lia “diferente” dos livros. Como quase todos os livros para crianças que há no Brasil são muito sem graça, cheios de termos do tempo da onça ou só usados em Portugal, a boa velha lia traduzindo aquele português de defunto em língua do Brasil de hoje. Onde estava por exemplo “lume”, lia “fogo”; onde estava “lareira” lia “varanda”. E sempre que dava com um “botou-o” ou “comeu-o”, lia “botou ele”, “comeu ele” – e ficava o dobro mais interessante (LOBATO, 2019, p. 161)

Ao falar com as crianças como se falasse com os leitores dos textos, fazendo uso dessa linguagem clara e compreendida por elas, Lobato ganhava, mais e mais, pequenos e jovens admiradores que devoravam seus textos, fossem de teor literário, fossem de teor pedagógico.

Esses pontos nos mostram a importância de seu projeto literário na história cultural da nossa nação. Trata-se de um escritor que não só marcou a época na qual viveu, mas também continua presente no consumo de bens culturais, tal como é a literatura. Isto aponta para a importância de estudá-lo em razão dos seus destaques. 

Reinações de Narizinho foi publicada da forma como hoje a conhecemos em 1931, pela Companhia Editora Nacional. Sobreviveu ao tempo e tem ganhado novas edições desde que os textos infantis entraram em domínio público. Com a liberdade que isso acarreta às editoras, temos visto, desde o texto integral com opções de paratextos mediadores até a reescritura de algumas partes do texto lobatiano, alterando a concepção de algumas personagens, em especial, de Tia Nastácia³.

Na edição de Reinações de Narizinho, da Companhia das Letrinhas, publicada em 2019, aparecem inovações no paratexto “nota de rodapé”. Por ampliar sua estilística e sua funcionalidade na situação de comunicação nas quais são aplicadas, as notas em questão não se configuram como notas tradicionais de rodapé, mas sim como “conversas de rodapé”, breves comentários paralelos ao texto entre as próprias personagens, como se elas participassem, nos dias atuais, dessa conversa, atualizando o discurso realizado no início do século XX. A inovação de estilo já é percebida no início, mas a sua funcionalidade necessita de uma investigação um pouco mais minuciosa a fim de apresentarmos o seu característico fim. 

Nesse caso, parece que houve uma preocupação editorial com a composição dessas notas, de maneira que, ao dialogarem com o texto de época, o atualizam para o leitor contemporâneo que, ao deslocar o olhar para as notas, consegue não apenas compreender melhor o texto lobatiano como também se diverte com a forma, de certa maneira hilária, como são elaboradas. Essa marca lúdica das notas dialoga com o humor presente no próprio texto infantil de Lobato, gerando um efeito de certa naturalidade nas “conversas de rodapé”. 

Partindo disso, nossa hipótese é a de que a funcionalidade das “conversas de rodapé” é direcionada para uma mediação do leitor, entendendo não apenas a temporalidade da obra como também do autor. Ela resulta em divergências conceitual e ética, pois, além de as conversas terem como conteúdo pontos relacionados a palavras não usuais hoje, há também questões sociais, cujos entendimentos se alteraram com o tempo. Isso pode ser percebido em mais de um comentário que as crianças emitem sobre Tia Nastácia, ao longo do texto. O foco de nosso trabalho, dessa maneira, é o de estudar essas notas no interior do texto de 2019 e se – ou em qual medida – elas funcionam como “notas mediadoras”. Por se tratar de uma investigação na área dos estudos literários, o método utilizado para a averiguação de nossa hipótese foi o de pesquisa bibliográfica com leitura de textos literários e teóricos.

O paratexto “nota de rodapé” 

Em linhas gerais, quando vamos analisar uma obra literária, temos o objeto texto como elemento primordial do processo de análise. Genette (2009, p. 09) infere que “[…] esse texto raramente se apresenta em estado nu, sem o reforço e o acompanhamento de certo número de produções, verbais ou não […]”. Desse modo, têm-se os paratextos, cuja configuração se dá como um recurso de apresentação desse objeto em questão. A funcionalidade desta ferramenta tem como fim “[…] torná-lo [o livro] presente, para garantir sua presença no mundo, sua ‘recepção’ e seu consumo, sob a forma, pelo menos hoje, de um livro […]” (GENETTE, 2009, p. 09, grifos do autor).

Para adentrar na concepção do paratexto “nota”, Genette (2009) apresenta uma abordagem mais formalista, sem considerações funcionais. O autor diz que “[…] uma nota é um enunciado de tamanho variável (basta uma palavra) relativo a um segmento mais ou menos de tamanho determinado de um texto e disposto em frente ou como referência a esse segmento […]” (GENETTE, 2009, p. 281). A nota é tratada pelos aspectos parciais do texto de referência e, além disso, também pelo aspecto local do enunciado disposto nela. Tais pontos formais, pela perspectiva do autor, são os que melhor distinguem as notas dos demais paratextos. 

Pelo seu caráter de referenciar um segmento localizado no objeto em questão, o texto apresenta um sistema de referência para marcar determinada parte, isso na sua configuração habitual. O “chamar” das notas, consoante Genette, organiza-se “[…] por meio de um determinado procedimento (algarismo, letra, asterisco) e indexar cada uma delas por uma chamada idêntica ou por uma menção referente ao texto (palavra, linha) […]” (GENETTE, 2009, p. 283). Segundo o teórico, quando se configura nas margens da página, dispostas em frente ao segmento, a indexação é dispensada.

Sobre os momentos oportunos de sua aparição, Genette (2009, p. 283) aponta que “[…] a nota pode aparecer a qualquer momento da vida do texto, conquanto que uma edição lhe ofereça a ocasião […]”. São comentados três tipos de “ocasiões pertinentes”: notas originais, as quais são elaboradas na primeira edição, dada com frequente uso; notas posteriores, as de segunda edição; e, por fim, as notas tardias (GENETTE, 2009). Há situações que motivam o aparecimento de notas como a divergência temporal, apontando para realidades ou verdades não mais presentes. Para isso, são utilizadas as notas tardias, as quais podem ser motivadas pela mudança de valores éticos de acordo com a evolução da sociedade. 

Como já mencionado, a edição é o elemento chave para o oferecimento de ocasiões a notas. Em razão disso, há notas originais que são retiradas nas suas edições posteriores, ou outras adicionadas que, no entanto, são logo excluídas na edição subsequente. Enfim, as notas surgem de acordo com a necessidade relativa ao tempo da publicação.

O paratexto em evidência é abordado como um enunciado de leitura facultativa, ou seja, o leitor pode ou não interromper sua leitura para se dirigir às notas. A relatividade é definida de acordo com as necessidades do leitor. Isso resulta em uma reflexão do tipo de destinatário das notas, e é endereçada a “[…] apenas alguns leitores: aqueles a quem possa interessar determinada consideração complementar ou digressiva, cujo caráter acessório justifica exatamente a colocação em nota […]” (GENETTE, 2009, p. 285). Tais apontamentos refletem para uma responsabilidade do leitor, se irá utilizá-las ou ignorá-las, visto serem tratadas socialmente com discriminação e invisibilização por parte de muitos leitores.

Desse modo, compreendendo tais pontos, podemos entender qual é a atividade social a que o gênero discursivo “nota de rodapé” se integra socialmente. Para isso, devemos refletir, primeiramente, sobre o que é gênero discursivo. De acordo com Adelino e Nascimento (2017, p. 110), a perspectiva bakhtiniana define “[…] os gêneros discursivos como formas relativamente estáveis de enunciados, elaborados de acordo com as condições específicas de cada campo da comunicação humana”. Há ainda a considerar, a partir da visão dos autores, “[…] os aspectos individuais e sociais, sempre vinculados a uma situação concreta de uso, na qual os enunciados devem ser vistos na sua função no processo de interação […]” (ADELINO; NASCIMENTO, 2017, p. 111).

Por conseguinte, faz-se necessário entender essa concepção de gênero do discurso. O pensamento bakhtiniano apresenta como se dá a relação do texto no seu funcionamento, sendo este o ponto importante para a pesquisa, uma vez que a discussão se encontra também relacionada ao funcionamento das não convencionais notas de rodapé presentes em Reinações de Narizinho (2019).

As conversas (não-convencionais notas) de rodapé 

Há um total de trinta e oito notas de rodapé no decorrer da edição estudada. Seria o número ideal? Deveria haver mais? Difícil decidir, pois muitas notas poderiam também chatear o jovem leitor. Acreditamos que o número em questão foi pensado para um leitor individual, que lê sozinho, e também para um leitor com mediação escolar, que terá o auxílio de um professor-mediador em seu processo de compreensão e discussão do texto.

Mais notas, entretanto, representariam mais “espaço” no texto, maior custo na venda do livro, seja ele físico, seja em e-book. Por isso, parece-nos que a ideia é a de que haja as tais “notas mediadoras”, mas não em excesso. Um mediador sabe considerar o que um leitor fala de importante sobre um texto literário, e aproveitar-se dessa possibilidade para despertá-lo para outras questões do texto que estabeleçam relações com o comentário pertinente do leitor. Assim, na medida em que funcionam como “notas mediadoras”, elas também não precisam vir em excesso, não devem cansar o leitor, mas sim despertá-lo para pensar em como resolver suas dúvidas em outra passagem que lhe cause desconforto ou questionamentos quanto ao entendimento do texto literário. 

A “chamada” das notas é feita de uma maneira que nos parece bastante eficiente, destacando-se aos olhos do leitor. O modo como é marcado o segmento localizado desperta a atenção dele. Vale lembrar que não é feito de uma só maneira, cada segmento localizado tem um desenho diferente. Podemos perceber isso pelas duas imagens abaixo: 

Figura 1 – Segmento localizado “pachorra”

Fonte: Lobato (2019, p. 83)

 

Figura 2 – Segmento localizado “bodoque”

Fonte: Lobato (2019, p. 86)

Além disso, as conversações têm um esquema de marcação das falas (caixa de enunciados com cores diferentes), conforme podemos ver nas duas figuras abaixo correspondentes aos segmentos localizados acima:

Figura 3 – Nota de rodapé do segmento localizado “pachorra”

Fonte: Lobato (2019, p. 83)

 

Figura 4 – Nota de rodapé do segmento localizado “bodoque”

Fonte: Lobato (2019, p. 86)

Aos comentários de trechos localizados na edição agregam-se elementos lúdicos. A explicação tem um tom divertido e uma apresentação atraente, com imagens dos falantes, diferença de cores para a marcação das falas e variedade nos desenhos para destacar os segmentos de fala. Vimos que Genette (2009) aborda o gênero como leitura facultativa, uma vez que quem edita uma obra literária e constrói notas tardias parte de um princípio objetivo de mantê-las presentes na memória de uma sociedade. Algumas conversas entre Lúcia (Narizinho) e Emília, as duas personagens que realizam a mediação em Reinações, trazem a ideia de uma ficção paralela, pois resultam em pequenos debates sobre certos elementos socioculturais que não mais estão tão presentes na nossa atual sociedade, como questões sobre preconceito, ou ainda reflexões sobre dúvidas linguísticas, como gírias que caíram em desuso. Isto nos faz expandir a concepção de um paratexto, sugerindo uma estilística mais criativa e poética a uma prática linguística tão comumente restrita e “sem cor”. 

A forma como é construído o trabalho editorial das notas parece contribuir para transformar a leitura de facultativa a obrigatória, mas de uma obrigação relativamente prazerosa, já que, embora o leitor tenha de interromper a sua leitura do texto para se dirigir à nota, isso lhe pode render a compreensão de uma dúvida e ainda gerar-lhe certo divertimento, tendo em vista que o humor entre as personagens Emília e Narizinho procura ser mantido. Isso se daria em razão da estilística da nota ser, de certa forma, quase irresistível de ser consumida, afinal, uma vez lida, induziria o leitor infantil ou juvenil a pensar no texto das notas como uma ficção contemporânea das personagens (que acontece em paralelo ao texto lobatiano) ou mesmo em uma chamada para que o leitor contemporâneo participe também dessa conversa. 

Haveria, com isso, uma nova definição de notas: lúdicas e prazerosas, notas mediadoras a partir de diálogos, notas de rodapé, enfim, com uma função reveladora no mundo da leitura dos jovens leitores contemporâneos, já que elas parecem convidá-los para participar da história. 

Além disso, é possível ainda apontarmos um certo caráter mercadológico delas: o leitor infantil/juvenil do século XXI precisa de algum contexto explicativo sobre como entender determinadas falas de personagens construídas no início do século XX e essas notas poderiam contribuir para tal finalidade, seja para a leitura individual, seja para a que é feita na escola, com a mediação de um professor. Não estamos advogando aqui que um texto literário necessite de notas para ser compreendido, mas que os textos infantis lobatianos, em determinadas situações de leitura, acompanhados dessas notas lúdicas, poderiam contribuir para uma leitura mais autônoma e contextualizada desses textos produzidos por Lobato, proporcionando, inclusive, autonomia para o leitor solitário. Nas conversas encontradas no texto literário, percebemos Narizinho e Emília mostrando suas perspectivas e suas cosmovisões centradas nas divergências entre elementos presentes na sociedade da primeira metade do século XX e na de hoje. 

A mediação de leitura 

Para iniciar a discussão sobre as notas como “mediadoras”, lembramos Soares (2008, p. 22), em Livros para a educação infantil: a perspectiva editorial: “[…] a edição, pelas escolhas e seleções que faz e pelas intervenções com que dá forma final ao texto autoral, é em grande parte determinante da natureza e características do livro infantil, das possibilidades de acesso à leitura, dos modos de ler.” Além disso, Soares também reflete sobre a maneira como o público interage com a obra, não ocorrendo de forma direta, mas indireta uma vez que o livro “chega ao leitor com as marcas e interferências de um conjunto de profissionais – uma estrutura coletiva, a edição” (SOARES, 2008, p. 21, grifo da autora). 

As interferências, por meio das conversas de rodapé, revelam um caráter mediador na maneira como a obra é elaborada. Desse modo, Romano (2017) aponta para o sistema literário de Antonio Candido, a tríade autor-obra-público, de forma que inscreve o mediador de leitura no eixo que liga o público leitor à obra e ao autor. 

A partir dessas considerações, não apenas o mediador como também o trabalho editorial do livro contribuem para a aproximação entre obra-leitor. Vale ressaltar que, nesta situação, os dois se encontram em uma delimitação mais frágil, pois suas funções acabam tendo os mesmos fins, apesar de as esferas de atuação de cada um serem divergentes. Percebemos que o papel de mediador não se dá exclusivamente por um indivíduo, também há outros métodos para se atingir o mesmo objetivo, podendo ser através de uma personagem, conforme defendido por Romano (2017), ou até pelas notas, sendo essas a investigação da presente pesquisa. 

Dessa forma, selecionamos alguns segmentos localizados que norteiam algumas das conversas de rodapé:

  • Negra beiçuda: Neste caso, temos duas ocorrências do mesmo tipo. Na primeira ocorrência, Emília comenta que não entendeu o significado da expressão e Narizinho explica dizendo que são resquícios da escravidão e finaliza com “hoje em dia não é mais aceitável falar desse jeito” (LOBATO, 2019, p. 16). Apresenta-se, desse modo, um questionamento ao modo de ler e entender tal discurso, compreendendo injustiças fortemente presentes na sociedade da época em que Lobato escreveu e que hoje, a partir de outro olhar sobre o assunto, problematizamos tal questão a fim de discuti-las em vez de omiti-las ou apenas aceitá-las. Já na segunda ocorrência, a fala aponta para as conversas com o caráter de uma ficção paralela, pois Emília diz “e agora fui euzinha que chamei a tia Nastácia de ‘negra beiçuda’…” (LOBATO, 2019, p. 51), demonstrando assim uma retomada do que já foi dito na página 16 da obra, citada acima.

A título de exemplificação, inserimos, a seguir, a imagem de uma das notas de rodapé ao final de uma página. Vejamos:

Figura 5 – Nota do segmento localizado “negra de estimação”

Fonte: Lobato (2019, p. 09)

Essa nota, assim como todas as outras, aparece ao final de uma página no livro impresso4, logo abaixo do texto lobatiano. Essa como todas as outras trazem as “carinhas” de Emília e Narizinho (toda a coleção, pela Companhia das Letrinhas, está sendo publicada com essas notas e, em cada texto, são escolhidas duas personagens para manterem o diálogo contemporâneo) para avisar o leitor de que são elas que estão batendo esse papo e que pode ir ao encontro de uma eventual dúvida que ele possa ter sobre o texto literário, seja ela referente a uma expressão antiga, que caiu em desuso, seja ela referente a uma temática que hoje é vista e entendida de forma diferente da compreensão que desse assunto se tinha na época de publicação do texto infantil.

A nosso ver a nota permite que nosso leitor jovem não passe pela expressão sem nela se atentar e repensar sobre seu uso nos dias atuais. A elaboração desse texto pode, inclusive, contribuir para que esse leitor, no caso, um leitor solitário, procure compreender melhor esse debate, podendo solicitar a ajuda até mesmo de um familiar ou de um professor. Em sala de aula, a nota pode permitir que o professor-mediador abra espaço para escutar seus alunos-leitores e mediar o que eles têm a apresentar sobre o assunto. 

  • Raggedy Ann: Narizinho não é a única detentora do saber, Emília também é. Nesta conversa, Emília apresenta quem é Raggedy Ann, uma boneca de pano muito famosa também, mas nos Estados Unidos. Vejamos a seguir, na íntegra: 

Figura 6 – Nota do segmento localizado “Raggedy Ann”

Fonte: Lobato ( 2019, p. 193)

  • Estafermo: Há também comentários a respeito de palavras não usuais para o leitor contemporâneo, como a deste segmento localizado. Emília se questiona e Narizinho esclarece trazendo o uso da palavra na Idade Média e o significado dado na época de Lobato. Além disso, ainda são colocados posicionamentos em relação aos acontecimentos na obra, como também apontados por Narizinho: “Nada a ver com o Visconde, que é espertíssimo.” (LOBATO, 2019, p. 92). Vejamos: 

Figura 7 – Nota do segmento localizado “estafermo”

Fonte: Lobato (2019, p. 92)

  • Dê um quinau: Não só palavras, mas também expressões que não são usualmente utilizadas hoje também são colocadas como temáticas das conversações. Narizinho relata o que significa “corrigir um erro ou dar uma lição” (LOBATO, 2019, p. 88) e ainda tece comentários sobre a narrativa, tal como no fragmento “como o Visconde deu ao Doutor Caramujo, que é todo convencido, mas não sabia seu próprio nome científico” (LOBATO, 2019, p. 88). Confira: 

Figura 8 – Nota do segmento localizado “dar um quinau”

Fonte: Lobato (2019, p. 88)

Compreendendo essas ponderações incluídas na edição de 2019, trazemos aqui as reflexões de Pina (2011, p. 134). Para a estudiosa, quem escreve a obra literária:

[…] o faz inserido em um dado lugar e em certo tempo, ou seja, não está isento das questões que angustiam o mundo que gera e condiciona a mão que digita, o computador que a arquiva e o leitor que irá interagir com ela num primeiro momento e, também, em posteriores apropriações. Nenhuma obra, literária ou não, é ‘inocente’. Sua ‘culpa’ está em ser resposta à vida, da forma como ela se manifesta para seu responsável autoral. E sua ‘culpa’ se agrava, quando o sujeito que a recebe joga com ela, pois no cenário desse jogo estão suas expectativas pessoais, suas paixões – ou sua ausência de paixão. (PINA, 2011, p. 134)

A “culpa” existente em Reinações de Narizinho, de acordo com o que podemos ver pelo segmento supramencionado “negra beiçuda”, sugere que ponderamos as concepções históricas com as éticas atuais. As conversas de rodapé parecem controlar a intensidade desse jogo, podendo possivelmente manter um texto considerado clássico, uma vez que as conversações de rodapé dialogam entre as épocas, constituindo assim o tal processo de mediação da leitura através do “reavivamento” da obra devido ao processo de revitalização das edições gráficas. 

Um outro exemplo a se considerar é o de uma cena em que Narizinho quer arranjar um casamento para Emília com Rabicó. Ela descreve a boneca da seguinte forma: “Emília é feia, não nego, mas muito boa dona de casa.” (grifo que demarca o segmento localizado) (LOBATO, 2019, p. 50). Há neste momento uma valorização da mulher enquanto quem cuida da casa, uma visão hoje considerada de certa forma machista e ultrapassada. Na conversa de rodapé, a boneca rebate tal discurso por ter sido chamada de feia e ainda ressalta que não gosta de varrer a casa (aliás, quem gosta???). Em seguida, Lúcia se desculpa e a chama de linda, além de refutar que a mulher branca, naquela época, era valorizada por saber cuidar do lar. Seria assim ainda hoje? E a mulher negra, como seria na época, como é nos dias atuais? Por fim, a boneca finaliza com a gama de possibilidades da atuação feminina no mercado de trabalho, podendo a mulher hoje ser o que ela quiser. 

Eis aqui um momento oportuno para o professor-mediador trazer à tona tal discussão tão bem vinda nos dias atuais, já que a obra literária permite isso. Fica esclarecida nossa posição sobre a ideia de que a obra lobatiana deve ser discutida e sua leitura contextualizada e dimensionada para posições socioculturais que se alteraram com o tempo. Isso é bem vindo, não a retirada de circulação da obra o que sugeriria apagar, hipocritamente, toda a polêmica, como se a não circulação mais do texto literário implicasse a resolução do problema sobre preconceito e racismo nos textos de Lobato como muitos sugerem.

A mediação e a formação do leitor 

Se como vimos na seção anterior, ocorre um processo de mediação da leitura através das conversas, temos concomitantemente um processo de formação de leitor a partir de práticas leitoras. Mediar é estar no meio, entre dois extremos, entre a obra/autor e o público leitor, tendo como objetivo estabelecer um diálogo, ouvindo primeiramente o que o leitor tem a dizer. À medida que isso ocorre com eficiência, o leitor, que desse mediador necessita, vai criando autonomia para interagir com a obra em si e poderá ganhar proficiência leitora.

As conversas de rodapé trazem discussões a respeito de vários conteúdos, inclusive pontos considerados bastante polêmicos na literatura lobatiana, como apontados anteriormente. Há reflexões sobre sociedade, tal como questões de racismo e misoginia abordados na obra, além de comentários sobre elementos religiosos, variações linguísticas e expressões idiomáticas no que tange à historicidade da língua. 

Por meio da discussão desses elementos nas conversas de rodapé que nomeamos como “notas mediadoras”, apresenta-se uma realidade diferente da do leitor contemporâneo, contribuindo assim para um enriquecimento da formação intelectual desse leitor. Com isso, trazemos a perspectiva de Pina (2011, p. 133): 

[…] o texto literário é uma ‘outridade’ que se desdobra quando lido, isto é, nele o leitor se vê diante de um outro imediato, que é o próprio texto, e do efeito decorrente do contato com esse outro, que é a transformação de si, a ‘refação’ do sujeito que lê, a partir do lido.” (grifo da autora). 

Além de o leitor se deparar com a “outridade” do texto literário em si, levamos em consideração também a temporalidade autoral da obra literária. Por exemplo, a conversa da página 83, de Reinações de Narizinho (2019), tem como segmento localizado a palavra “pachorra”. Ao nos depararmos com tal escolha lexical, é comum gerar certo estranhamento, pois tal vocábulo não se faz presente no cotidiano linguístico do português brasileiro jovem. 

Nas palavras de Pina (2011), é utilizada a palavra “refação”5 para descrever a maneira como o leitor fica depois de ter lido um texto literário. Este processo defendido pela autora pode ser categorizado enquanto um produto de mediação da leitura, que é, neste caso, a questão da própria formação. Os leitores geralmente não serão os mesmos depois do contato de atividades mediativas, resultando na refação do próprio sujeito, ou seja, é possível que ele mesmo se refaça a partir da prática de leitura que lhe foi esclarecedora e enriquecedora, em alguns casos, já que isso é sempre o que se espera que aconteça, embora nem toda leitura possa ser considerada desmistificadora de ideias.

Portanto, a partir da sequência dos procedimentos destacados, as conversas de rodapé podem contribuir para uma melhor inserção na temporalidade de Lobato e compreensão daquela época em relação à de nossos dias. Além disso, é importante lembrar que o leitor apreende os conteúdos de leitura a partir de sua experiência de mundo e elas se tornarão reflexões que poderão aguçar o senso crítico de quem lê. O processo mediador dessas notas na obra infantil dessa edição do texto lobatiano poderá levar o jovem leitor a perceber que elas são bem vindas e talvez até necessárias para viabilizar práticas leitoras contemporâneas mais eficientes do texto clássico infantil de Monteiro Lobato..

Considerações finais 

A partir do que expusemos, tomando como ponto de partida a edição de 2019, pela Companhia das Letrinhas, de Reinações de Narizinho, podemos inferir que a mediação de leitura é considerada uma prática essencial para o diálogo entre obra e público leitor, uma vez que a leitura dos clássicos é comumente requerida sobretudo pelas instituições educacionais. Pensar estratégias objetivando efetivar esta interação parece-nos necessário a fim de contribuir para a imersão do leitor com o produto literário. Além disso, a atividade mediativa colabora significativamente para a conversação entre o leitor da época da obra e o dos dias atuais.

As conversas/notas de rodapé ou como as nomeamos, notas mediadoras, presentes na edição de 2019, trazem uma nova estilística para um paratexto muitas vezes desprezado pelos leitores. Percebemos que elas funcionam como se fossem uma ficção paralela à narrativa, já que o leitor, em seu processo de leitura, talvez goste de acompanhar tal discussão paralela em forma de intertextualidade.

A criticidade da mediação traz uma outra perspectiva à tona: a formação do leitor. Por apresentar ponderações a tratamentos sociais, termos religiosos e elementos presentes em uma outra época, podemos, com as notas, cooperar para a estruturação de uma cosmovisão mais aguçada da sociedade dos anos 20 e 30 do século XX versus a dos anos 10 e 20 do século XXI. A historicidade presente nos textos de Lobato, até pela necessidade de considerá-lo um homem de seu tempo, é fator que auxilia neste processo de uma visão de uma determinada época. 

Desse modo, as conversas/notas de rodapé podem contribuir significativamente para o desenvolvimento de técnicas a serem utilizadas para o fortalecimento da atividade mediativa, diversificando, com isso, não só o trabalho editorial, mas também a maneira como um educador pode lidar com o produto literário em sala de aula. Pela sua configuração crítica e descritiva, pode possibilitar ao leitor reconhecer falas consideradas preconceituosas atualmente como também curiosidades sobre elementos históricos presentes na obra colaborando, desse modo, para a formação crítica do leitor infantil e juvenil dos dias atuais. 

Referências

ADELINO, Francisca Janete; NASCIMENTO, Erivaldo Pereira. Gêneros discursivos: um olhar sobre a entrevista de seleção de emprego sob a perspectiva de Bakhtin. Revista de Gestão e Secretariado, [S.l.], v. 8, n. 2, p. 107-227, 2017. Disponível em: https://www.revistagesec.org.br/secretariado/article/view/601. Acesso em: 27 mar. 2021.

GENETTE, Gérard. Paratextos Editoriais. Trad. de Álvaro Faleiros. Cotia-SP: Ateliê Editorial, 2009. 

LAJOLO, Marisa. Monteiro Lobato: um brasileiro sob medida. São Paulo: Moderna, 2000.

LAJOLO, Marisa, ZILBERMAN, Regina. Literatura infantil brasileira: uma nova / outra história. Curitiba: PUCPRess, 2017. 

LOBATO, Monteiro. A barca de Gleyre. Tomo II. São Paulo: Brasiliense, 1956. 

LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2019. 

PEREGRINO, Giselly dos Santos. Entre castigos e brincadeiras: a infância na obra de MONTEIRO LOBATO. In: YUNES, Eliana (org.). Monteiro Lobato: ideias ao infinito. Coleção leituras e leitores (formação). Rio de Janeiro: Cátedra Unesco de Leitura, 2011. p. 54-68.

PINA, Patrícia Kátia da Costa. Duas narradoras lobatianas e seus convites ao leitor: Dona Benta e Emília. In: YUNES, Eliana (org.). Monteiro Lobato: ideias ao infinito. Coleção leituras e leitores (formação). Rio de Janeiro: Cátedra Unesco de Leitura, 2011. p. 133-144.

ROMANO, Patrícia Aparecida Beraldo. Dona Benta: mediadora de leitura em Dom Quixote das Crianças e Geografia de Dona Benta, de Monteiro Lobato. 272f. Tese (Doutorado em Letras) –  Programa de Pós-graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, Mackenzie, 2017. 

SOARES, Magda. Livros para a educação infantil: a perspectiva editorial. In: PAIVA, Aparecida; SOARES, Magda (org.). Literatura infantil: políticas e concepções. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008. p. 21-34.

Notas de fim

  1. Pesquisa realizada através do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa), tendo como órgão financiador a Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisa (Fapespa). 
  2. Informações sobre a correspondência passiva de Monteiro Lobato com seus missivistas infantis disponíveis no Arquivo Raul de Andrada e Silva, subsérie: cartas infantis. Disponível em http://www.ieb.usp.br/raul-de-andrada-e-silva/, acesso em 30/04/2021.
  3. Há, nos dias atuais, uma extensa e bem vinda discussão sobre a questão do racismo e preconceito que estariam presentes nos textos infantis de Lobato. Informamos que este texto advoga a necessidade de se condenar qualquer atitude racista nas sociedades brasileira e mundial e a necessidade também de afirmarmos que, além da condenação de atitudes assim, somos contrários ao racismo e a qualquer tipo de preconceito. Entretanto, não advogamos aqui que obras literárias escritas em outra época histórica devam ser banidas do contexto de leitura ou mesmo de sala de aula. Acreditamos que é necessário discutirmos essas obras, inclusive porque sobreviveram como clássicas, mostrando como hoje determinadas acepções, tidas como racistas e/ou preconceituosas, não são mais aceitas socialmente e tentando discutir como essas obras podem ajudar a entender a formação da identidade do brasileiro desde a publicação delas até os dias atuais. A polêmica em torno da obra infantil de Monteiro Lobato teve início em 2010, com a publicação de um Parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) informando sobre a necessidade de contextualização do racismo/preconceito ditos presentes na obra do escritor ou mesmo da retirada futura, na época, de uma obra lobatiana específica, a saber, Caçadas de Pedrinho, dos programas de leitura do governo. Essa polêmica se estendeu por anos a fio. O interessante é que ela abriu espaço para uma discussão contextualizada e baseada nos mais diversos estudos que se tem feito da obra de Monteiro Lobato nos últimos anos. Vimos como importante agregar essa informação inicial, mas lembramos que o objetivo a ser discutido neste texto não é o racismo/preconceito, por isso, não nos estenderemos nessa questão.
  4. Vale lembrar que o texto também foi publicado em e-book, mas essa particularidade da nota ao final não foi mantida, elas estão no texto, mas como as páginas no e-book têm disposição diferenciada, as notas não parecem ser exatamente de rodapé.
  5. Pela perspectiva de Pina (2011), o processo de refação se caracteriza enquanto transformação do leitor através do lido. Se antes da leitura o sujeito é um, após a interação com a obra se estabelecerá a refação de si.