Horácio Campos, vulgo Furnandes Albaralhão, autor de Caldo Berde
Horácio Mendes Campos, nasceu em 1902 no Rio de Janeiro e morreu na mesma cidade em 1964. Entre 1930 e 1933, publicou versos satíricos, paródias de poemas famosos e pensamentos, tudo em linguagem macarrônica, sob o pseudônimo de Furnandes Albaralhão, no jornal satírico A Manha, de Apparício Torelly, o famoso Barão de Itararé. Outros dois foram também utilizados, embora em frequência muito pequena: Juequim Pardellas e Vocage da Silva. Pelos pseudônimos, já fica fácil perceber que sua linguagem macarrônica se baseava na prosódia do Português luso, à feição do que realizou Juó Bananére com o Italiano (no seu La divina increnca, de 1915). Caldo Berde foi publicado em 1931, em primeira edição, tendo saído uma segunda em XXXX. Alguns trechos desse livro foram reproduzidos na revista A Pomba na década de 60. Em Caldo Berde, Horácio Campos reuniu parte das paródias publicadas em A Manha, especificamente no Supprimento de Purtugali. Hoje, Caldo Berde é uma raridade bibliográfica, nem a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro tem exemplares. Além da vida ficcional e autoral de Furnandes Albaralhão, Horácio Campos foi também um compositor, autor de libretos de teatro de revista, violonista, mas é o português parodiador que aqui nos interessa. Vamos focar no Furnandes e não, no Horácio.
Com a interferência da prosódia lusa na grafia, Furnandes Albaralhão consegue efeitos engraçadíssimos, que seguem em paralelo com o humor das imagens e dos argumentos, a exemplo de alguns de seus provérbios, quase sempre atribuídos a figuras conhecidas da história ou da literatura de Portugal:
“O amôre é uma coisa que cando dá n’uma p’ssoa, ella fica logo vesta. E si a p’ssoa já é vesta antão náim se fala.” — Ulibáira Salazáre
“Cáim é rico é rico. Cáim é pobre que se damne.” — Antônio Nobre
Mas o chama mais a atenção, talvez, sejam suas paródias de poemas, em geral de poemas famosos da tradição literária brasileira, como este que vem de soneto de Olavo Bilac:
UBIRE AS ISTRELAS
A instrunumia é uma ciência aérea que estuda as rilações internacionais entre os planetas e os seus similhantes.
GINIRAL GRAMONA.
— “Ora, dirâis, ubire estrelas… Passo!
“Num póde sêre!” E eu bus dirâi: — “Aflito
“para ubí-las, acordo, olho p’ru ispaçu,
“tiro a cêra d’ubido com um palito,
“i cumbirsamos, digo-lhe e rupito,
“até que rompe a uróra. Aí, que eu faço?
“Bou miter-me na cama, quensadito,
“com uma dôre infadonha nu queichaço.
Dirâis, agora: — “Isso é tapiação!
“Cumu é que podes tal cumbersa têre
“cu’as istrilitas que tão longe estão?
E eu bus dirâi: — “Amâi uma quechópa
“váim nutrida, sucada e habeis de bêre
“e ubire istrelas de pagóde! É sópa!
Mas não apenas de prosódias engraçadas se alimentava essa poética macarrônica. Segundo Rita Salma Feltz[1], o valor de sua obra residiria na “forma inusitada e tão própria com que Furnandes Albaralhão abordava os assuntos, e na originalidade dos próprios assuntos que vão desde escatologias, como o peido, o bodum, a “cuçaira”, até questões um tanto mais abstratas, filosóficas, como a morte, o comunismo e o amor”.
Boa leitura!
[1]Em sua dissertação de mestrado “O artifício da simulação (o macarrônico do Português de Portugal em A Manha:1926-1947 e no Diário do Abax’o piques:1933)” (UFSC, 2005).